“A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento”, de Edgar Morin

Edgar Morin, no livro A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento, afirma que “é preciso substituir o pensamento que isola e separa por um pensamento que distingue e une. Tal reflexão motiva o conhecimento como produto da inter-relação de saberes, capaz de favorecer o senso da responsabilidade e cidadania.

Foto: Stijn Dijkstra

Neste artigo falaremos sobre a obra intitulada “A Cabeça Bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento”, do filósofo francês Edgar Morin. Nela, Morin discorre acerca das limitações apresentadas pelo paradigma cartesiano reducionista frente aos complexos desafios dos dias atuais. Nesse sentido, aponta para a necessidade de uma reforma paradigmática que conduza a um modelo de pensamento integrador e amplo, ao qual denominou “pensamento ecologizante”.

Limitações do modelo mecanicista

Ao longo da década de 50, o biólogo alemão Ludwig von Bertalanffy formulou a Teoria Geral dos Sistemas, afirmando que o todo é mais que o conjunto das partes que o compõem. Já durante a década de 60 uma segunda Revolução Científica foi iniciada em diversas áreas do saber.

O paradigma cartesiano-mecanicista, pautado pelos princípios da separação e da redução, passou a ser questionado no mundo científico. Algumas de suas desvantagens e inadequações tornaram-se evidentes, dentre elas estão:

  • A incapacidade de perceber o global;
  • Tornar invisível os elementos multidimensionais e a relação entre as partes e o todo;
  • A impossibilidade de compreender o complexo;
  • O atrofiamento das possibilidades de reflexão; e
  • A perda de aptidões naturais para contextualização dos saberes.

Necessidade de novas percepções

As insuficiências desse pensamento fragmentado e superespecializado indicam a necessidade de transformação nas formas de conhecimentos. Esta transformação implica na substituição do pensamento que isola e separa pelo que distingue e une; do redutor pelo complexo; e da causalidade linear e unidirecional pela causalidade circular e multirreferencial.

Trata-se de um saber que compreende a interligação e interdependência entre as partes e o todo. Reconhece as multidimensionalidades, bem como as realidades antagônicas e complementares, e respeita as diferenças percebendo ao mesmo tempo sua unicidade.

Uma cabeça bem-feita é uma cabeça apta a organizar os conhecimentos e, com isso, evitar sua acumulação estéril.”

Para Morin, a reforma paradigmática é uma reforma do pensamento concernente à capacidade para organização do conhecimento. A questão essencial da organização do saber gira em torno da aptidão geral para situar e tratar os problemas e de princípios organizadores que conectem os saberes, conferindo-lhes sentido. Afirma que os seres humanos já nascem com esta aptidão, que está diretamente relacionada ao livre exercício da curiosidade e à formulação de questionamentos. Esclarece que, quanto maior for nossa inteligência geral, maior será nossa capacidade para solucionar problemas especiais e complexos.

Trata-se de um pensamento “ecologizante” na medida em que favorece a contextualização, situando todo fenômeno em relação ao seu meio ambiente e evidenciando como este o influência de diversas maneiras. É ainda um pensamento do complexo, pois busca identificar conexões entre o acontecimento e seu contexto global. Percebe a um só tempo a unidade e a diversidade, caracterizando-se como um pensamento unificador.

Princípios do pensamento que une

Abaixo, mencionamos sete princípios a serem observados de maneira complementar a fim de alcançarmos um pensamento ecologizante, segundo o autor.

  1. Sistêmico ou organizacional: conecta o conhecimento das partes ao conhecimento do todo, reconhecendo as propriedades inerentes a cada um e à soma dos dois;
  2. Hologrâmico: percebe a totalidade contida em cada parte do todo;
  3. Do circuito retroativo: baseado nos processos auto-reguladores, em que as retroações dos fenômenos podem ter inúmeros efeitos, ultrapassando o princípio da causalidade linear;
  4. Do circuito recursivo: refere-se a um circuito gerador no qual “os produtos e os efeitos são, eles mesmos, produtores e causadores daquilo que o produz”;
  5. Da autonomia/ dependência: concebe os seres humanos como seres auto-ecoorganizadores, que apesar de se autoproduzirem, dependem de energia, informação e organização do meio ambiente para manter sua autonomia;
  6. Dialógico: compreende a indissociabilidade de noções contraditórias a fim de conceber um fenômeno complexo. Ou seja, um “pensamento deve assumir dialogicamente os dois termos, que tendem a se excluir um ao outro”, tais como ordem/ desordem/ organização;
  7. Da reintrodução do conhecimento em todo conhecimento: reintroduz o sujeito e seu contexto à teoria científica.

Organização do Conhecimento

Morin ressalta que, a reforma do pensamento é uma reforma paradigmática que diz respeito à nossa capacidade de organização do conhecimento, de modo a possibilitar o desenvolvimento pleno da inteligência geral. Coloca a importância de percebermos que a nossa lucidez depende do grau de complexidade segundo o qual organizamos nossas ideias.

Disponível em: https://fiosdegaia.com.br/o-pensamento-ecologizante-de-morin/. Acesso em: 04 de agosto de 2020.